segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Conflitos e Ocupações no Rio de Janeiro em pauta. (O que realmente aconteceu e deveria ser feito?)



Jornalistas acompanham a operação policial no Complexo do Alemão - RJ

Nos últimos dias houve muita repercussão nacional e internacional sobre as tomadas de regiões dominadas pelo tráfico de drogas na cidade do Rio de Janeiro. O mundo noticiou o ocorrido, todas as atenções se voltaram para a ‘cidade maravilhosa’. Na TV inúmeros canais exibiram ao vivo imagens espetaculares e o decorrer do conflito a todo o momento. Os ataques da PM, Forças Armadas, BOPE e companhia contra a barbárie no Complexo do Alemão ou na Vila Cruzeiro, repercutiram nos principais sites, canais e jornais do mundo. Vamos citar alguns: BBC, CNN, The New York Times, El País, Clarín, Le monde, The Washington Post, Le Figaro, The Gardian e outros. Nas redes sociais da internet a notícia também obteve uma grande recepção, foi um dos assuntos mais comentados do mundo no Twitter, em determinado momento 3 dos 5 principais tópicos (TT’S Mundiais) eram sobre esse evento, no Facebook e no Orkut comunidades sobre o tema só cresciam. Enfim os principais meios de comunicação estavam assistindo, comentando, debatendo, noticiando e em sua grande maioria de forma totalmente positiva o “enfrentamento” aos traficantes na futura sede da Copa do Mundo e das Olimpíadas. Alguns até de forma no mínimo irresponsável propagaram falácias ao noticiar o caso como se fosse à vitória da sociedade sobre os bandidos, como se fosse o dia D ou um marco histórico, como se fosse a política mais pragmática dos últimos anos. Alguns jornalistas chegaram até a indagar furiosamente sobre o porquê esse confronto direto e bem armado com os traficantes, não foi feito antes? É brasileiro tem memória curta, não vai se lembrar da idêntica Operação Rio (94/95), até porque resultou em muita coisa pro povo e a mídia lembrar não é? . (Ah! Quem dera que isso tudo fossem meros comentários isolados).



Os discursos em gerais foram assumidamente triunfalistas, o efeito dessa grande promoção midiática foi a aprovação quase unânime da população. Porém pontos importantes foram esquecidos nesse imbróglio todo. Primeiramente é um absurdo chamar de inteligente ou eficaz, uma medida em que apenas combate a mão de obra barata sem perspectiva desse tipo de criminalidade. Seria inteligente sim, se usassem ao menos metade desses mesmos agentes de segurança, para combater as fontes de financiamento do tráfico nos morros e comunidades carentes. A baía de Guanabara, o Porto (No caso específico da cidade do Rio) e as fronteiras nacionais (No caso amplo do país inteiro) são as portas de entrada das drogas e armas em gerais (Algumas são armas de guerra, logo veio do exército).

Afinal, não são os traficantes do morro que as fabricam, na realidade são encomendadas por essas facções e como todo bom sistema capitalista, há uma hierarquia no processo. Cadê os verdadeiros barões do tráfico? Esses que são os mais nocivos para a sociedade, até por ganharem as maiores fatias do ‘bolo’ tanto no sentido de dinheiro quanto de poder. Se é para enfrentar o crime organizado, a prioridade é combater aonde há o maior lucro, obviamente não é nas favelas e sim nas fontes de financiamento. Essa escolha de administração não interessa o governo federal e o estadual, até por isso eles não o priorizaram (Isso para não entrar no papo da legalização das drogas). ‘Ah, mas existe a Delegacia de Repressão ao Crime Organizado no Rio’ se a imprensa mostrasse as condições que a DRACO está hoje, com certeza seria um avanço para uma mídia mais democrática, entretanto não mostra que esse importante serviço de inteligência se encontra sem estrutura, sem uma boa remuneração, sem equipamentos básicos de trabalho, sem equipe suficiente, e olha que como a DRACO existem outras com a mesma situação, como bem lembrou o Deputado Estadual Marcelo Freixo (PSOL-RJ) em um de seus pronunciamentos recentes. Assim fica difícil o antigo e atual governo reclamar da corrupção nos órgãos policiais. É bom deixar claro que os verdadeiros chefes do tráfico de entorpecentes, os barões do varejo estão lavando o dinheiro na bolsa de valores, construindo hotéis cinco estrelas espalhados pelo mundo (Fechando acordos a margem da lei nos mesmos). O mexicano bilionário Joaquín Guzmán é um exemplo desse perfil. Logicamente isso não se combate apenas no RJ (Uma das rotas).

Em 2005 o relatório mundial sobre drogas das Nações Unidas, revelou que o valor do mercado ilícito de drogas foi estimado em 13 bilhões de dólares ao nível de produção, 94 bilhões ao nível de preço de mercado e a mais de um trilhão baseado nos preços de cultura, levando em conta inclusive as perdas. Isso porque a pesquisa da ONU foi a 5 anos atrás e é apenas um cálculo aproximado. Logo a lucratividade dos inatingidos pelas políticas disfuncionais de combate, pode ser maior do que o estimado e desse período até 2010 com certeza já cresceu. Veja bem nem a Nova Zelândia, Uruguai, Equador, Irlanda, Hungria, Portugal e a Argentina juntos em um ano produzem tantas cifras (É impressionante o fluxo do mercado de drogas, você tem noção desse valor? ).



Forças da Ordem, retomando as favelas.


Essa forma de combater da atual administração é falha, em 2007 o mesmo governo entrou no Complexo do Alemão fortemente armado, matou 19 e saiu. Até a 4 semanas atrás a região continuava absolutamente da mesma maneira. De 2003 a 2009 foram mortos 7.854 civis por ações policiais no Rio de Janeiro. Mais de mil por ano, índice assustador, maior do que muitos países. Há quase um padrão no perfil das pessoas executadas, que é o negro, pobre, favelado e jovem. Ingenuidade acreditar que confrontos armados nas favelas podem acabar com o crime organizado. Ter a polícia que mais mata e que mais morre no mundo não resolve. Esse tipo de ação repressiva e muito bem exposta pela mídia, que é apenas matar, prender, recolher drogas e armamentos pode até de imediato enfraquecer, entretanto não acaba com a criminalidade. Muito pelo contrário, no decorrer do tempo essas medidas os fortalecem, pelo simples fato de valorizar ainda mais o produto do consumo ilegal. Quanto maior a repressão, maior o preço da mercadoria até por ser proíbida e estar em oferta, dessa forma a atratividade e as propinas não menos importante também aumentam. É simples, é a lei da oferta e da procura, um dos pilares do capitalismo. Até quando eles não irão reparar nisso?


População carioca corre no meio do tiroteio.

A administração estadual de segurança pública do RJ não tem efetivo para ocupar as favelas da capital, imagina as do interior (A sua lógica válvula de escape, se já não é). O que está se desenhando de concreto mesmo é um projeto de cidade olímpica e não de segurança pública, essas ocupações estão atendendo as necessidades ‘olímpicas’ (de interesse privado). As ‘retomadas’ pelas polícias são nos morros da Zona Sul, ao redor do Maracanã, Jacarepaguá e a zona portuária, ou seja, áreas de investimentos privados como por exemplo o imobiliário e turístico (Como diz os documentos secretos de diplomacia entre BR-EUA vazado pelo WikiLeaks). A única exceção é na Zona Oeste, onde só tem uma UPP e que fica na única comunidade que ainda não era dominada por milícias. Logo o tráfico de drogas irá continuar ou em um racicíonio lógico piorar nas áreas carentes que não fazem parte do mapa olímpico, incluindo as cidades do interior (É óbvio que não são todas as favelas que tem tráfico). Em relação as milícias (Hoje esse gênero de criminalidade já é maior que as ‘facções’ do tráfico das favelas), as áreas ocupadas pelas UPP’s não são as dominadas pelos filhos bastardos do gato orçamentário, por isso eles não mudaram de nenhuma forma o seu comportamento. O lado positivo nesse circuito, é que a Secretaria de Segurança está deslocando o seus batalhões para alguns morros, essa é idéia é boa, que é trabalhar com o que tem. Mas são áreas pequenas ou médias e que a violência não é tão grande como em outras (Prioridades), entretanto esse passo que está sendo apelidado como ‘UPP informal’ é interessante e alternativo, uma ação diferente que não era feito antes. É bom ressaltar que essas unidades pacificadoras do Estado não estão chegando para todas e nem para a maior parte das comunidades carentes mesmo contando com as ‘informais’.



Mapa da distribuição das UPP'S e dos ataques realizados pelo crime organizado.

Outra medida eficaz é antes de tudo ‘ocupar’ as polícias, filtrar da corporação a tão exposta banda podre (agentes corruptos). Assim valorizando os verdadeiros policiais, guerreiros que arriscam suas próprias vidas pela segurança. A esmagadora maioria das importantes modalidades de ação criminal no RJ (Se quiser ler Brasil, não há nenhum problema), está sistematicamente vinculada com os segmentos corruptos da polícia. Em forma de omissão por ‘arrego’, outros negociam armas, outros viraram até empreendedores do tráfico, ou seja, isso se dá de vários modos. Um modelo histórico de ‘ocupação’ é a LAPD, hoje uma das polícias mais respeitadas do mundo. Entretanto antes de conquistar esse notório título, o Departamento policial de Los Angeles passou por um grande processo de filtragem. O persistente Richie Roberts e sua brilhante equipe investigaram a profundidade e extensão do crime organizado na região. Todos os caminhos levaram a um ponto convergente chamado Frank Lucas (Um verdadeiro Barão/chefe do Tráfico), após um esquema bem articulado para derrubar a máfia envolvida com o tráfico de drogas. Final da operação, Frank Lucas e todos os traficantes vinculados a ele foram presos, metade da polícia de Los Angeles foi demitida por corrupção no caso, um verdadeiro limpa. Soldados, capitães, pilotos do exército e até agentes da CIA foram descobertos no esquema, todos eles faziam parte do crime organizado. Eram usados aviões de guerra para transportar heroína dentro dos caixões dos soldados mortos, direto do Vietnã para os EUA (‘Heroína da melhor qualidade’). Era uma sub-máfia dentro do organismo do Estado, no entanto não ocorreram muitas punições com os últimos.

Esse acontecimento apesar de não ocorrer em semelhante conjuntura, deixa bem nítido a relação de interdependência dos agentes corruptos e a bandidagem (Fato comum no crime organizado, quase uma regra natural). No caso particular do Rio de Janeiro, o tráfico cresceu em sociedade com segmentos ‘podres’ da polícia, ele foi protegido, até de certo modo patrocinado por esses setores, ligados principalmente pela cumplicidade e omissão. Richie Roberts primeiramente queria acabar com o tráfico em Los Angeles e acabou derrubando metade dos policiais da corporação da cidade, um escândalo na época. A extraordinária história virou até filme ‘American Gangster’ conhecido aqui no Brasil como ‘O gângster’ estrelado pelo excepcional Denzel Washington e não menos notável Russell Crowe.



Romeu Tuma ex-Diretor Geral do DOPS e Ex Senador por SP.

A arquiterura das corporações policiais está equivocada, é preciso transformar a instituição e suas formas de organizações, pois é um sistema herdado de outra realidade, da Ditadura. O modelo atual inviabiliza a transparência de gestão, controle interno entre outras coisas, o Tropa de Elite (1/2) mostra de forma esclarecedora essa questão. Até é importante ressaltar que algumas instituições no Brasil, estão mudando a formação policial e para os já formados estão orientando para agir mais ‘democraticamente’ no cotidiano. Basta uniformizar essa formação. Esses asssuntos passam desde a Lei de Anistia até a polêmica PEC 300. É de total prioridade que se aprove os reajustes da PEC 300 tão defendida pelo Luiz Eduardo Soares e que condene os militares envolvidos em crimes na Ditadura. Esses primeiros passos são simples, equiparar o salário dos policiais, abrir os arquivos policiais e condenar os assassinos. Até porque é possível ver os respectivos crimonosos fardados hoje em dia nos poderes legislativos sendo representantes públicos, ou são ironicamente instrutores ensinando ‘conduta ética’ e formando novos policiais/militares, outros estão exercendo as mesmas funções ou aposentaram. Enquanto isso, os familiares que perderam parentes, combatentes pela democracia no Brasil, não sabem nem ao menos o que aconteceu com eles. E veem esses torturadores por aí livres, leves e soltos. Assim faça-se a justiça?



Ônibus queimado por traficantes na bairro de Maria da Graça.

O próximo tópico de pouca evidência é o incompetente sistema prisional. Ocorreu no episódio uma transferência de responsabilidade, informações duvidosas e não resolução do problema no final das contas. Vamos nos ‘refrescar’. Uma parcela dos prisioneiros culpados por pertencer ao mercado ilegal de drogas na região carioca foi transferida para Catanduvas-PR antes dos “ataques”, devido as limitações estruturais, superlotação, corrupção incontrolável dos funcionários da prisão...ou melhor resumindo, por não conseguir manter os bandidos realmente presos. De repente há uma série de ataques no RJ, ditas como resposta da ‘bandidagem’ pelas implantações da UPP. Me desculpe mas reagir queimando ônibus por aí, não é bem uma ‘resposta’ racional às respectivas implantações, com certeza tem um milhão de outras maneiras mais racionais de se responder as essas unidades policiais. Os traficantes não iriam jogar de maneira alguma a população para os braços do governo, para que o mesmo bancasse o ‘super-herói’ e consequentemente salvar a pátria como nos desenhos animados. As opções dentro desse contexto são: Ou o dito crime organizado das favelas é bem ‘burro’, é só os marginalizados pelos marginalizados ‘Nóix por nóix’ ou é uma resposta para renegociar as propinas cobrados pela banda podre ou outra coisa qualquer, menos resposta de insatisfação pelas UPP. Até a fala de que o governo forjou esses ataques é mais convicente e coerente do que o motivo propalado pelos principais meios de comunicação. (Quem melhor poderá saber ou dar pistas sobre essa situação toda é que tem -entrada- com o poder público e com os traficantes, alguém assim como o José Junior do Afroreggae). Pode ser tiradas algumas certezas, a primeira é que o recado foi ao Estado, os ataques foram direcionados a estrutura do governo e em menor escala aos civis(Cabines policiais - NÃO foram das UPP’s-, ônibus...), não houve por parte do crime organizado o interesse de matar ou ferir fisicamente a população, tanto que eles fizeram questão de tirar todos os cidadãos do ônibus, e depois de todos fora do automóvel, queimá-lo. Segunda certeza, as instituições estão notávelmente em parceria dessa vez, não há problema ‘político-partidário’. Terceira certeza, o perfil dos traficantes estão mudando e as facções perdendo força, o tráfico irá se fortalecer e as facções naturalmente enfraquecer, os consumidores estão buscando as drogas de forma segura, não é dificil encontrar pessoas (Geralmente jovens) de classe média ou alta vendendo drogas. E pra finalizar esse parágrafo, digo que a Secretaria de Segurança do RJ concluiu que a ordem da qual fosse realizado os ataques, partiu da cadeia de Catanduvas-PR. Só pode ser uma piada (Se é que partiu de lá). E agora? Vão transferir os mesmos presidiários para outra prisão de novo ou vão resolver os problemas tão antigos e atuais do sistema prisional?

Outro ponto, esse já até bem mais comentado é a ausência do Estado em forma de saúde, esporte, lazer, educação, infra-estrutura nas favelas. Não adianta o Estado se fazer presente nas favelas só em forma de polícia (UPP’s - Segurança), é necessário entrar também com mais escolas, bibliotecas, prontos-socorros, postos de sáude, parquinhos, saneamento e assim por diante, essa sim é a verdadeira pacificação. Sem esses tipos de complementos sociais fica totalmente incoerente e inútil as UPP’s, sendo assim seria mais uma divisória social do que uma política de inclusão. Nos territórios ocupados, porém há iniciativas interessantes nesse sentido, espero que seja permanente e bem mais amplas.

O ibope (Confiável né Kajuru?) realizou uma pesquisa recentemente para saber se a população concorda com as medidas tomadas contra o crime organizado, 88 por cento responderam que apoiam. Dessa vez devo concordar com o IBOPE por ver in loco, essa elevadíssima aprovação. Essa pesquisa mostra mais uma vez como a nossa população é facilmente ‘manobrada’ e sem senso crítico de nada. Espero que os leitores não sejam cúmplices involuntários dessa contínua reprodução no mínimo omissa de fatos importantes.



terça-feira, 30 de novembro de 2010

Quando alguém compreende que é contrário à sua dignidade de homem, obedecer a leis injustas, nenhuma tirania pode escravizá-lo (Mahatma Gandhi).


A igualdade de dignidade e direito para todos, está no artigo I da Declaração Universal dos Direitos Humanos, norma adotada pela ONU em 10 de dezembro 1948, cujo o objetivo seria que as metas deste documento fossem praticadas por todos os países. Logicamente dos 192 Estados-Membros são poucos que põem em prática as finalidades estabelecidas. Nesses quase 62 anos desde que ela foi assinada, a realidade de muitos povos mudaram, entretanto está longe do ideal. Dentre as diversas discussões em relação à diversidade humana e direitos humanos as questões de gênero e étnica são fundamentais. O Brasil segue essa linha de transformação social, porém os fatos ainda mostram que há disparidade econômica, discriminação e preconceito resultante de um processo histórico no país. Por isso as medidas de ações afirmativas vêm sendo implantadas nos últimos anos, buscando eliminar essas desigualdades historicamente acumuladas.

Estas medidas tiveram origem no início do século XX na Índia (ainda como Colônia inglesa), porém sem o nome de ‘medidas afirmativas’, inicialmente com o intuito de que o parlamento indiano também fosse constituído por membros de castas ditas inferiores. Em 1947 após a independência, elas foram inseridas pela atual constituição da República da Índia, que entrou em Vigor em 26 de janeiro de 1950, com o objetivo de compensação as injustiças cometidas no passado contra os dalits (intocáveis). Na década de 60 os Estados Unidos, se tornaram referencial no assunto, o então Presidente John F. Kennedy implantou uma série de políticas de ações afirmativas, após um longo período de segregação ‘racial’, resultado da luta pelos direitos civis e de igualdade defendidas pelos ativistas dos movimentos negros. Essa política de reparação foi realizada em vários países da Europa, na Austrália, Malásia, Canadá, África do Sul, Nigéria, Cuba, Argentina dentre outros.

A política de ação compensatória se restringe ás parcelas discriminadas da população, que deste modo recebem um tratamento diferenciado. As principais áreas beneficiadas pela discriminação positiva são o mercado de trabalho (a contratação, qualificação e promoção de funcionários), a representação política, o sistema educacional e a mais conhecida e polêmica delas o sistema de cotas. Essas medidas têm sido coerentes até por que quando nasce um Preto/mestiço (Pardo) na favela/sertão e um branco em um bairro de classe média ambos tem a mesma capacidade intelectual, mas o decorrer do tempo as diferenças sociais vão prevalecendo e determinando uma desleal concorrência no futuro, em relação ao ensino superior, ao trabalho, qualidade de vida. Portanto, seria o excluído contra o incluído. Na literatura brasileira pré-modernista quem descreve esses dois ‘Brasis’ é Euclides da Cunha profundo conhecedor da realidade histórica e social do país, apesar de seguidor do Positivismo, Evolucionismo e Determinismo, em sua obra clássica “Os Sertões”, ele retrata essa grande barreira que divide o Brasil, entre os expulsos da sociedade e os inclusos.

O histórico de preconceito contra os negros é grande e ocorre principalmente pela sua ancestral condição de escravos por mais de 300 anos. Didaticamente falando, pois relatório da UFRJ diz que entre 2003 e 2009 foram libertados 40 mil brasileiros. Espantosamente no século XXI eles ainda viviam sob o regime servil e semelhante à escravidão. Desses 40 mil, 73,5% eram afro-descendentes, ou seja, mais de 7 em cada 10 trabalhadores que faziam parte de explorados libertados recentemente, 122 anos após a Lei Áurea ser sancionada, estudos atuais comprovam a existência de muitos brasileiros que vivem até hoje em situações degradantes, formas contemporâneas do escravismo.

Em nosso país, novos analfabetos funcionais vem se revelando, são incapazes de compreenderem dados (contas estatísticas), que retratam as proporcionalidades indicadoras da desigual condição vivida entre negros e brancos. O quarto Relatório Nacional de Acompanhamento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), lançado pelo governo federal neste ano, em março, indica que a desigualdade entre trabalhadores brancos e os de cor preta ou parda diminuiu, mas ainda é grande. Em 2008, os negros recebiam somente 56,7% da remuneração dos primeiros, um pouco mais que a metade, enquanto em 1998, esses números eram ainda mais assustadores, a população branca recebia cerca de 206 % da renumeração da negra, um pouco mais que o dobro.

O relatório afirma que a diferença entre ambos se mostra constante: Em 1990 37,1% dos afro-descendentes viviam abaixo da linha de extrema pobreza do Banco Mundial (US$ 1,25 ao dia), em 2008, esse número caiu para 6,6% porém entre os brancos, a queda foi proporcional ou quase isso, de 16,5% há 18 anos, para 2,8% no ano retrasado. Logo os números mostram que a proporção de pessoas muito pobres entre os negros é mais que o dobro que entre os brancos.

Um outro estudo publicado em 2010 pelo instituto de pesquisa Sangari, registra que a chance de um jovem negro ser morto é 130% maior que a de um branco. O estudo mostra que em 2007 morriam 2,6 jovens negros para cada 1 jovem branco, isso quer dizer que em cada 900 jovens que morriam 650 eram pretos ou pardos e 250 eram brancos. Em relação à posição econômica entre eles, pode-se dizer que 60% dos pobres no Brasil são constituídos por negros. Dentre as pessoas consideradas como indigentes 70% são afro-descendentes.

Os dados do IPEA, PNUD, DIEESE, IBGE, OIT entre outros também afirmam esse constrate. Porém, não é necessário tantos números, basta olhar a realidade do cotidiano e veremos nitidamente essa desigualdade. A visibilidade do negro em altos postos da sociedade é desproporcional à do branco. A mesma situação se dá nas favelas, que tiveram sua origem ligada ao fim do período escravagista no final do século XIX. Sem perspectiva de vida, sem opção de trabalho, sem terra, sem estudo e marginalizados os ex-escravos em busca de moradia iniciaram a ocupação informal de áreas desvalorizadas, de difícil acesso e sem mínima infra-estrutura. Os Presidentes da República Velha e da Ditadura só realizaram medidas e ações, que impossibilitaram a integração dos ex-escravos e seus descendentes à sociedade. Um exemplo criado nos anos de chumbo foi a lei do Boi, em 1968, no governo Costa e Silva. Filhos de fazendeiros sem problemas financeiros, que estudaram em escolas de prestígio e residiam na capital ou não, foram colocados em cursos de Agronomia e Veterinária através de cotas. Esses jovens não necessitavam ter seu acesso à universidade facilitado de tal maneira, a lei que era para ‘corrigir’ desigualdades. Logo, foi usada verdadeiramente para privilegiar uma classe alta da sociedade.

Seguindo a coerência dos estudos e dados, é como se a população negra estivesse muito doente, à beira da morte, na UTI, e a população branca com uma leve gripe. Esse é o diagnóstico social. Portanto, é incoerente e injusto tratar os pacientes da mesma forma, com o mesmo medicamento. Um deles merece um tratamento especial com mais atenção. Enquanto não estiverem na mesma condição esse cuidado diferenciado deve continuar.

Os resultados dos países que implantaram esse tratamento (ações afirmativas) são satisfatórios e estão servindo como modelo de reparações históricas para outros. O Brasil também realiza essa política, porém vem tendo dificuldade em sua aceitação é óbvio que há um custo-benefício: Quando uma sociedade tem um pequeno grupo que ocupa a maioria dos espaços importantes, ela é deficiente, contém uma democracia superficial. Se há grupos sem oportunidades, há pessoas talentosas, com potencial que estão sendo ignoradas, se forem criadas oportunidades através de medidas afirmativas, será possível reconhecer e integrá-las à economia e à sociedade, onde antes elas eram descartáveis. Não é apenas uma questão de igualdade, mas também de eficiência econômica, quando o perfil do líder refletir o perfil da base, na maioria das vezes a instituição funcionará melhor. Biologicamente não existem raças, somos iguais, mas a desigualdade étnica, de oportunidade, racismo, preconceito são fatos sociais. A sociedade tem que se auto-educar e viver de forma solidária, a condição de vida deve ser igual para todos, esse é um dos princípios de um Estado justo.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

A problemática do ENEM.


O Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) é o maior exame do Brasil, aproximadamente 4,6 milhões de estudantes se inscreveram nesse ano. Houve um enorme número de inscritos, esse elevado interesse pelo ENEM é consequência da importância que atualmente ele exerce, são variadas as suas finalidades porém as prinicipais são: O acesso ao Ensino superior em universidades (Tanto públicas como as privadas); atráves do Prouni (Programa Universidade para Todos), Sisu (Sistema de Seleção Unificada) ou de seleção parcial, do sistema de cota social ou “racial” (Um bom exemplo é a UFRJ); certificação de conclusão do Ensino Médio pelo EJA (Educação de Jovens e Adultos); avaliação da qualidade do Ensino Médio das escolas no país e é sempre bom lembrar que o exame a partir do ano letivo de 2011, será uma exigência para as pessoas que se candidatarem no FIES (Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior).

Nos dois últimos anos, aconteceram problemas graves em relação ao exame. Ano passado o Exame Nacional do Ensino Médio foi cancelado, pois ocorreu o vazamento do conteúdo que iria ser aplicado na prova (Roubo de cadernos), demonstrando nitidamente a frágil segurança da gráfica responsável pela impressão e distribuição dos cadernos a RR Donnelley. Um dos 3 autores do roubo, o funcionário da gráfica Felipe Pradella chegou a declarar em depoimento a Polícia que a segurança do Enem era uma “festa”. Em 2010 os problemas voltaram, entretanto dessa vez as cópias de determinados cadernos (Pra ser exato 21 mil, que para o MEC está tudo dentro da - normalidade técnica-) saíram defeituosas, com todo tipo de erro que se pode imaginar, questões repetidas, perguntas diferentes com numeração igual, perguntas do caderno branco no caderno amarelo, questões em falta, pra não falar da falta de preparo de muitos instrutores nas salas onde a prova foi realizada. A edição do dia 07/11/10 da Folha de São Paulo detalhou todas as falhas ocorridas (Abaixo o trecho retirado da matéria):

“1- Existiam duas questões 23, uma na frente e outra no verso da página. A primeira questão 23 era igual à questão 29 e a outra era idêntica à questão 21. Ambas as perguntas pertenciam à ciência humana.
2- A questão 33 era igual a 38; a 50 igual a 48; a 54 igual a 51.
3- As questões 34, 61 e 74 estavam replicadas em duas páginas.
4- As questões 35 e 73 estavam duplicadas, mas o conteúdo era diferente. Uma das questões 73 era igual a 75.
5- A questão 49 estava duplicada, mas o conteúdo era igual.
6- A questão 73 estava duplicada, mas o conteúdo era diferente.
7- A questão 81 estava duplicada e uma delas era igual a 80.
8- Da página 29 pulava para a 32; da 52 para 54; da 63 para 65 e da 75 para 78.
9- Até a página 5, o caderno era amarelo; 6-7 era branco; 8 amarelo; 9 era branco; 10-13 amarelo; 14 era branco; 15-16 amarelo; 17 branco; 18-21 amarelo; 22 branca; 23-24 amarelo; 25 branco; 26-28 amarelo.”

A ironia dos fatos é que tanto ano passado, como esse ano a ‘ganhadora’ da licitação do ENEM foi a RR Donnelley, logo a gráfica responsável pela distribuição e impressão dos materiais do Exame Nacional do Ensino Médio. De acordo com a nota oficial da própria empresa, ela acabou se responsabilizando pelos danos: “A RR Donnelley, na condição de gráfica contratada mediante processo licitatório para a impressão das provas do Enem 2010, garante o cumprimento de suas obrigações contratuais, responsabilizando-se por adotar as medidas necessárias para a solução dos problemas gerados, principalmente visando garantir os direitos dos estudantes eventualmente prejudicados".

Inegavelmente esses dois episódios mostram um dos principais erros da administração pública (Tanto em esfera municipal, estadual ou federal), que é a falta de gerenciamento dos contratos públicos. Alguns críticos dizem que na lei de Licitações e Contratos, o critério técnico em determinadas modalidades (A maioria esmagadora) não é objetivo, outros dizem que é objetivo, essa divergência não ocorre, por exemplo, no critério de preço, pois está bem explícito que quanto menor o preço, melhor a sua classificação. Contudo o consenso geral das opiniões aprofundadas em relação ao assunto, é que os contratos públicos no Brasil são um campo fértil de irregularidades e corrupção (Mais abaixo explicarei os motivos).

O fato é que a empresa que mais pontuou conforme as exigências definidas no edital da concorrência, de acordo com a ‘consciente’ comissão julgadora vinculada ao MEC, foi por dois anos seguidos a RR Donnelley. É inquestionável também que durantes dois anos seguidos houve irregularidades, de certo a gráfica provou não ser tão competente como a comissão julgou, e para reforçar, provou sua incompetência na distribuição e impressão do maior exame do Brasil duas vezes seguida (Em 2009 e 2010).

Um cidadão que compra algum produto ou serviço é absolutamente normal que o próprio confira se o que ele comprou está funcionando, se aquilo corresponde ao que pediu exemplos: X comprou uma televisão, é óbvio que ao chegar em casa, X irá verificar se está ligando, se está trocando de canal ou quando Y contrata um encanador para arrumar o vaso sanitário, ele logicamente após o serviço, irá testar se o vaso está dando descarga, se está ‘tudo nos conformes’.

Essa atitude habitual e lógica da população, não se tem nos órgãos públicos brasileiros nos casos de contratação de serviços privados (terceirizados). Pode-se observar que em qualquer empresa séria, a fiscalização dos contratos de serviços, está entre as obrigações do contratante, ou seja, o comprador tem obrigação de fiscalizar. Os bancos (Não necessariamente todos), por exemplo, também utilizam gráficas terceirizadas nas emissões de cheques, porém os cheques são produzidos em gráficas competentes, ultra-seguras, nas quais funcionários não têm acesso a esses respectivos setores e os poucos que tem, são revistados na saída e na entrada. Os bancos checam incansavelmente, cada etapa do processo de produção, armazenagem e envio todos os dias. Princípio que o Estado não segue na prática, pois na teoria a lei exige esse comportamento, mas são raras as repartições públicas que ‘fiscalizam’ ou gerenciam de forma eficiente os serviços contratados pelo governo.

As conseqüências (Ou objetivos disso tudo, como quiser interpretar) são o superfaturamento de obras, desvio de verbas, eleição de políticos para favorecer esse sistema (São muitos os ‘Sanguessugas’, fique esperto para não votar em um deles), uso da máquina, mais lentidão nos processos burocráticos; aprovação de reformas em obras (Exemplo estádio de futebol) ou novas construções públicas desnecessárias, avenidas, calçadas e ruas esburacadas entre outras obras incompletas ou mal feitas. Logo se tem a idéia de que as empresas escolhidas nas licitações (Não é regra), normalmente são aquelas com o melhor certificado de “propinagem” e não de eficiência técnica como alguns agentes públicos e a lei diz.

É o fiscal quem autoriza o pagamento do contratado, após verificar se o serviço foi cumprido adequadamente, no entanto o pagamento a execução de serviços inacabados ou com vários erros, se tornou comum no país (Não preciso citar exemplos dessa vez né? Basta olhar as obras públicas inacabadas ou com orçamentos surreais, espalhadas pela sua cidade).

É sempre bom deixar claro, que não afirmei ou dei (nem posso) a entender que houve propinagem, corrupção nesse caso da RR Donnelley, porém posso afirmar que aconteceram falhas consecutivas da empresa contratada, fato que propicia levantar um debate polêmico em relação à administração do Estado.

As universidades que aderem o ENEM (Não que a teoria/projeto em si seja ruim) como processo seletivo, principalmente aquelas de forma unificada pelo SISU, acabam caindo conseqüentemente no descrédito da falta gerenciamento dos contratos públicos.

No exuberante e rico Brasil (E em vários países, não sejamos hipócritas) falta capacidade em gerenciar os recursos públicos. Existem poucas ferramentas que permita realizar uma gestão de funcionários com base em resultados (Até mesmo para não atrapalhar as negociatas dos mesmos). Deveriam existir mais instrumentos para se punir um mau servidor, e recompensar aqueles que realizam seu trabalho produtivo com qualidade. Há uma evidência clara da necessidade de servidores nos ministérios (Ou órgãos públicos como quiser interpretar) que possam colocar a máquina para funcionar.

Quando ocorreu falha, é porque teve condições, que permitisse que o erro acontecesse. A partir da Identificação das causas, podemos criar armas para combatê-las. A população deve combater de várias formas esse mau uso do dinheiro público, protestar, exigir seus direitos como cidadão é importante, mas propor medidas alternativas para que essas condições que facilitam o acontecimento de erros mudem, são essenciais. Quando se faz isso, há uma redução drástica no número de problemas. Errado é persistir com um sistema provado ser falho. É sempre possível mudar algo partindo do conceito correto.

domingo, 31 de outubro de 2010

Tropa de elite 2 - Um filme extraordinário.


Do Latim extra-ordinariu, o que não é ordinário, que sucede raramente, excepcional, anormal, singular, maravilhoso, memorável, notável, acontecimento imprevisto ou inesperado, fora do habitual ou do orçado, aquilo que habitualmente não se faz. Esses são alguns dos adjetivos que definem o extraordinário "Tropa de Elite 2 - O inimigo agora é outro".

O filme de acordo com os dados da Rentrak EDI divulgados na quarta-feira (27/10), já alcançou a marca de 6,2 milhões de espectadores. O longa está em cartaz desde o dia 8/10 e o sucesso é tão grande, que está 'batendo' vários recordes de bilheteria (Filme mais visto na semana de estréia, filme mais visto desde a retomada do cinema nacional... e assim vai). É sempre bom ver um filme de qualidade, com recepção do público recíproca.

O José Padilha está revolucionando o cinema brasileiro em muitos aspectos, ele e sua equipe distribuíram o filme de forma independente. Óbvio que o orçamento veio do incentivo privado (para você tê-lo, o filme tem que ser 'grande' para possibilitar o retorno das cifras para o investidor). Até mesmo porque sem a distribuidora, só pode captar com a lei, o limite de R$ 4 milhões e o filme custou em torno de R$ 14-16 milhões (3 ou 4 vezes maior do que o captado por lei). Porém, da mesma forma eles viabilizam um novo caminho, uma alternativa para a rota de grandes filmes no país.

O próprio Padilha disse em recente entrevista ao Omelete.com os seus motivos: -'Primeiro porque não tem taxa de distribuição. Segundo porque não tem os prazos de pagamentos das distribuidoras. E terceiro, não tem a crosscolaterização, que é o seguinte: faz de conta que um filme faz dinheiro no Brasil, mas é lançado na Argentina, no Peru e perde - o Brasil paga as perdas dos outros mercados. Sem essas coisas, o filme fica mais rentável. Então eu acho que, de fato, com Tropa de Elite 2, inaugura-se uma via alternativa para o cinema brasileiro, que pode tornar o cinema brasileiro mais rentável, um sistema em que a distribuidora não cobra taxa de distribuição, não retém o dinheiro por um prazo de seis meses, que é o prazo de pagamento, e que a distribuição é remunerada por uma prestação de serviço. Essa é a ideia. E em que artistas, Wagner incluído, investem seu salário no filme. Se o filme der dinheiro, a gente ganha. Se não fizer, não ganha.'

Quem vive a margem do cinema mainstream (Isso também pode servir para a música, literatura, mídia...), sabe o quanto é difícil executar/divulgar o seu trabalho. Um exemplo das aberturas deixadas pela distribuição autônoma, é que apesar do Tropa de elite 2, ter sido assistido por cerca de 6 milhões de pessoas em aproximadamente 700 salas no Brasil, o mesmo só chegou ao Piauí (a Capital Teresina) com 21 dias de atraso, somente nessa sexta-feira, dia 29/10.

Os filmes, assim como todos os produtos, são classificados por categorias, tem o drama, a comédia, o terror, o suspense, a ação, o romântico entre outros. O Tropa de Elite 1 e 2, foram tão amplos que não caem em uma categoria normal, principalmente o segundo, são tão ricos em conteúdo (Características fortes de ação, comédia, drama, suspense...), que classificá-lo em uma vertente, seria um insulto aos admiradores do cinema e sem dúvida alguma iriam limitá-los.

São poucas as obras cinematográficas que chegam a esse patamar. O resultado é fruto dentre outros motivos, do timaço (a base é do 1º filme) composto para realizar esse trabalho. Um ótimo roteiro, excelente produção, excepcional edição, brilhante direção somado aos talentos de atores que viveram/interpretaram com tanta intensidade personagens como Beirada (Seu Jorge), Diogo Fraga (Irandhir Santos), Major Rocha (Sandro Rocha), Fortunato (André Mattos), Coronel Fábio Barbosa (Milhem Cortaz), Clara (Tainá Müller) e outros, sem esquecer é claro de André Matias (André Ramiro), Coronel Nascimento (Wagner Moura). O filme parecia muito real, ao assistir a atuação de Seu Jorge como Beirada, tive a sensação de estar assistindo um documéntario com imagens reais de uma rebelião (mesma coisa com Diogo Fraga - Irandhir Santos). Com certeza esse é o melhor filme nacional da temporada, será muito difícil algum outro superá-lo.

Como pessoalmente gosto de dar palpites antecipados, e até seguindo uma grande tendência de palpiteiros, arrisco que Tropa de elite 2, será o indicado do Brasil ao Oscar ano que vem (Apenas um chute justo e lógico).

A história em si, é a continuação do Tropa de Elite 1, O Nascimento é quem narra a história (assim como no primeiro), mas a diferença está no 'arco dramático', que desta vez é nele, é ele quem se transforma (começa de um modo e acaba de outro). Antes de rodar o filme, tem uma frase bem exposta na telona - Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência - ou algo parecido, obviamente no decorrer do filme o enunciado irônico se dissolve. Muitos espectadores saíram da sala do cinema comentando: - "Esse filme foi um soco no estômago" frase que devo concordar, por o filme ser tão realista e abordar temas polêmicos de forma corajosa. Um número razoável de críticos, ultilizaram esse termo.

Necessariamente o longa expõe falhas da administração pública, especificamente as consequências ligadas as opções de política de segurança pública no estado do Rio de Janeiro (a realidade do policial honesto no RJ é muito dura, má remuneração, vários riscos, ambiente coercitivo a corrupção, milícias, segundo emprego ilegal...agora que está mudando).

Esses erros admistrativos (ou eleitoreiros como quiser interpretar), possibilitaram um domínio irregular em favelas da região, pelas agora conhecidas Milícias. Há várias polêmicas enquanto a sua definição, por causa da dificuldade de explicar essa realidade nova, que é extramemente dinâmica. Normal que haja contravérsias, além do mais a palavra milícia, tinha outro significado antigamente, mas suas principais características de acordo com o sociólogo Ignácio Cano (Conceito adaptado) são: 1 - Comando/controle de um território (favelas, comunidades carentes), de seus habitantes através de um grupo ilegal e armado; 2 - A característica de coação (Uso da força, constragimento, ameaça) com o objetivo de manter o controle, logo os moradores tem medo do que possa lhes acontecer e não se 'rebelam'; 3 - A motivação é a lucratividade, o verdadeiro combustível deles é gerar renda, através de diversas atividades econômicas como transporte alternativo, venda de gás, de água, sinal de TV a cabo pirata entre outras fontes, é irracional pensar que esses grupos querem apenas restaurar a paz e a ordem nas comunidades; 4 - Um 'legítimo' discurso priorizando a proteção dos moradores e à instauração de uma ordem (Expulsar traficantes - Falso), na realidade trata-se de oferecer proteção paga contra eles mesmos; 5 - Participação ativa e reconhecida de agentes do Estado, essa participação precisa ser divulgada localmente, para que todos saibam que os milicianos são formados por policiais, bombeiros, agente penitenciário e outros, eles fazem questão disso. Essa publicidade do seu papel público cumpre importantes funções, assim atrai vantagens aos seus esquemas e conseqüentemente a manutenção deles.

De acordo com a CPI das milícias, presidida pelo Deputado estadual reeleito Marcelo Freixo- RJ (PSOL), o lucro mensal da maior polícia mineira, conhecida como Liga da Justiça, de Campo Grande, é de cerca de R$ 2 milhões.

Quando você combate milícias, você está combatendo deputados, vereadores de base governista (que possui articulações com o executivo, imunidade...), não é uma coisa fácil, contudo se compararmos por exemplo o governo passado do Anthony Garotinho onde apenas cinco milicianos foram presos e o atual no qual 480 estão preso, você repara uma maior preocupação em relação a essa modalidade criminosa.

A polícia mineira oferece ameaças concretas à sociedade, isso é evidente. No México, por exemplo, grupos milicianos evoluíram para o que lá já é chamado de -narcomilícia-, ou seja, a milícia atuando no narcotráfico. Relatos de cariocas/moradores de comunidades controladas por esses grupos, já denunciaram que algumas milícias já têm envolvimento com o tráfico, que é caso da favela Vila Joaniza, na Ilha do Governador, na zona norte. Denúncia que contraria a filosofia inicial deles (Ver a característica n° 4, do conceito de milícias - sociólogo Ignácio Cano acima).

O Tropa de Elite é cultura de massa, ele foi assistido por milhões de pessoas. Enquanto no primeiro filme, o povo admirou o Bope e seu líder capitão Nascimento, mesmo assistindo as cruéis cenas de tortura produzidas por ele e seu batalhão. Massificando deste modo, o apoio rígido na guerra contra o tráfico (Frustrando a verdadeira intenção da equipe no Longa). Deve-se entender que quando os 'caveiras' matam um traficante na favela, nasce três com maior disposição (É um círculo vicioso). O segundo filme deixou claro o que a equipe queria discutir, logicamente eles não concordaram com a primeira interpretação da maioria dos espectadores, e de forma genial produziram essa resposta, apontando no segundo a sua verdadeira opinião e intenção. 'Tropa de Elite 2 - O inimigo agora é outro' é como esse blog, tem a intenção de acender o senso crítico nas pessoas, tenho certeza que quem assistiu o filme, saiu com um pensamento diferente, um olhar mais amplo e questionador da realidade.

domingo, 17 de outubro de 2010

Mudanças profundas na política – Uma revolução cultural.

O Brasil vive de fantasias, o interesse dos ‘cidadãos’ pela política é insignificante, e os poucos que se atraem, tem uma concepção definitivamente ilusória da realidade. São raríssimas as opiniões que ainda não se corromperam por essa ideologia. O povo no decorrer da história se tornou apenas uma ingênua massa de manobra das mais variadas facções.

Independentemente de coligações ou siglas partidárias (excluindo alguns escassos partidos nanicos e idealistas, que não tem representatividade eleitoral, ou seja, impotentes), eleições hoje em dia, são mera ficção. Não importa quem seja eleito, mudarão apenas as peças do tabuleiro, os grupos beneficiados com privilégios pela situação (quem os financiou/apoiou ou venha a financiar/apoiar) e os aventureiros, entre os quais no governo serão divididos. Nada será resolvido realmente, se não mudar a regra do jogo, da administração do Estado brasileiro, que se transformou em um balcão de negociatas.

Empresas ou financiadores não investem grandes cifras em candidatos por admiração a democracia. Logicamente esperam que seus interesses sejam feitos caso o beneficiário seja eleito. O objetivo do investidor varia e o que define é a sua área, tanto pode estar interessado no fortalecimento de privatizações, na redução/aumento de impostos, planos de expansão de setores econômicos (corporações profissionais), favorecimento em contratações, facilidades com agências reguladoras, órgãos de controle, favores fiscais e assim por diante. Observe que muitos exemplos citados acima, não deixaram de ser um interesse coletivo (Apesar de limitar-se a alguns grupos de pessoas).

Entre os maiores financiadores das campanhas eleitorais dos grandes partidos estão empresários, empreiteiros e banqueiros. É comum usar o cargo para favorecer doadores. Para confirmar esse fato, basta ver os principais investidores das campanhas presidenciais, com maior representatividade eleitoral, é nítido a presença desses ‘apreciadores da democracia’. Um exemplo são os bancos: Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB) foram os que mais arrecadaram com eles (A mesma quantia por sinal, que coincidência!), entretanto Marina Silva (PV) tem um apoio de destaque, o banqueiro português Álvaro Antônio Cardoso de Souza, ex-presidente mundial do Citibank Private Bank (O mesmo banco, que durante os anos 80, foi o maior credor privado da dívida externa brasileira), principal arrecadador da campanha verde à Presidência da República.

Em 2009 foi criada pelo Dep. Federal-SP Ivan Valente (PSOL) a CPI da dívida pública, onde foi comprovado que cerca de 36 % do orçamento da União no ano, foi gasto apenas com o ‘débito’. Sendo que em sua maioria, são apenas juros a favor da dinâmica do mercado internacional, ou seja, cada vez que os juros sobem no mercado internacional, a dívida do país também aumenta (são proporcionais) e quando o Brasil entra em um momento de crise, aumenta os juros para captar dólar, conseqüentemente a dívida de novo cresce. Assim fica claro, o motivo de tanto interesse dos Bancos em campanhas eleitorais, afinal, são eles quem mais saem ganhando com esse ralo de escoamento das nossas riquezas.

Incompreensível, pois de acordo com dados do IBGE de 2008, o Brasil possui 14.109.000 habitantes com 15 anos de idade ou mais que são analfabetos, o que representa quase 10% da população total. A taxa de analfabetismo funcional de pessoas com 15 anos ou mais é de 21,7% da população. Investir de fato na educação nem pensar, mas bilhões encima de bilhões em juros com histórico de contradições e injustiças, para banqueiros ficarem mais ricos, a fim de financiar suas campanhas, com certeza.

O mais contraditório foi saber que através da Comissão Parlamentar de Inquérito dessa dívida, que se conseguiu ter acesso aos contratos, no qual o governo federal negociava com os bancos. Desde 1990 (gestão do Fernando Collor), ninguém tinha acesso a esses contratos, conflitante, pois uma das básicas funções de um Dep. Federal, é fiscalizar os gastos do orçamento do governo federal. Após 19 anos de muitos gastos inúteis serem feitos (Cerca de R$ 2 trilhões para ser exato), foi confirmado esse rombo, que de acordo com a lei é legal.

Alguns políticos fazem auto-doações que chegam a porcentagens bem elevadas dos bens que declaram possuir. Outra indagação é como que um candidato gasta recursos tão grandiosos para se eleger, a um cargo que nem de longe gerará (oficialmente) algo parecido com o valor aplicado. Pra quem acredita na existência de Papai Noel, em renas voadoras e abiogênese (geração espontânea) de dinheiro, isso é normal e compreensível.

De acordo com os dados do site, àsclaras.org, as eleições de 2008, movimentaram R$ 1.724.497.478,23 apenas declarados. É um absurdo a quantidade de gastos que se tem nas eleições. Em SC teve um vereador eleito, que teve 4ª maior campanha do Brasil em 2008, perdendo somente para os três principais candidatos à prefeitura de São Paulo. Se dividir o número de votos dele, com a receita declarada, seria R$ 31.076,19 por voto. São valores exagerados que causam indignação ao serem comparados com o miserável padrão de vida da população brasileira.

Hoje em dia os candidatos estão investindo grandes valores em marqueteiros e superproduções de TV, para iludir o povo. A sociedade deixou-se levar pelas miragens e falsas resoluções (maquiagens) do governo ou ficaram desacreditados ao ver as corriqueiras notícias de corrupção, como isso fosse motivo de desânimo e não de espírito de mudança.

Atualmente na dita política é raro que o idealismo mova as peças. Recursos públicos elevados são dirigidos, sem qualquer critério ou controle. Um exemplo é à contratação de assessores, os quais, em quase sua totalidade, não passam de cabos eleitorais sem preparo político, pagos com dinheiro público.

São necessárias, mudanças profundas na política, quebrar paradigmas, costumes enraizados em nossa cultura, criar medidas alternativas e pragmáticas embasadas no interesse público e na transparência. O impedimento é o Estado, o seu projeto de administração é completamente ‘eleitoreira’, esse sistema é mantido pelos despolitizados ou conhecidos também como analfabetos políticos. Fato que causa uma lista renovável e abundante de disfunções do governo na prática, ou seja, o Estado acaba sendo mais parcela do problema do que solução.